No país do futebol e do racismo, venceram o talento, a resistência e a bola. Há 80 anos, Edson Arantes do Nascimento nascia para se tornar, já aos 17, um fenômeno do esporte. Demorou pouco para o jovem negro ser consolidado pela opinião publica e de especialistas como o “Rei” dos gramados.
Eterno camisa 10 do Santos Futebol Clube, Pelé celebra oito décadas nesta sexta-feira, 23 de outubro. Não há noticiário de TV, rádio ou portais que deixem a data passar em branco. Assim como não existia defensor capaz de impedir com que ele avançasse no campo.
Três Copas do Mundo pela Seleção Brasileira (1958, 62 e 70), duas Libertadores da América e dois Mundiais de Clubes com o escudo do Alvinegro da Vila Belmiro, além dos mais de mil gols em toda a carreira. Fora uma extensa lista de títulos paulistas, brasileiros, dentre outros. Não foi à toa que Pelé “parou uma guerra”.
Conflito na África
O ano era 1969. Dia 4 de fevereiro, Nigéria. O Peixe tinha um amistoso agendado em Benin City. O país africano vivia uma guerra civil, que teve início em maio de dois anos antes, época em que a região do Biafra, no sudeste nigeriano, se emancipou. Houve conflito até janeiro de 1970, os separatistas foram derrotados e o saldo registrado apontou para o cálculo que pode ter superado a marca dos 2 milhões de mortos, numa conta jamais encerrada.
A comoção global contra a violenta repressão do governo da Nigéria sobre os biafrenses levou várias figuras mundialmente famosas e organizações a tentarem intervir e conter o conflito. Papa Paulo VI, John Lennon e até a ONU se aventuraram. Mas, nenhum deles obteve sucesso. Só Pelé.
Levado ao país africano a convite do governo local, o Alvinegro Praiano esticou a estadia no exterior. O desafio seria contra uma seleção da região do centro-oeste. A turnê santista pelo continente deveria ter sido finalizada três dias antes em Moçambique. Mesmo fora da programação inicial, a partida entrou no calendário dos representantes brasileiros.
De acordo com relatos do clube paulista, as autoridades nigerianas decretaram um cessar-fogo. Dessa forma, a delegação do Peixe poderia ir ao estádio Ogbe em segurança, retornando posteriormente ao hotel em que estava hospedada.
O Santos venceu o compromisso por 2 a 1. Toninho Guerreiro e Edu marcaram os gols. No dia seguinte ao duelo diante da equipe local, o Alvinegro deixou a Nigéria, que viu a guerra continuar na mesma intensidade de antes, terminando apenas com a total dominação da região separatista.
Versões e relatos
Recentemente, o episódio completou cinco décadas e ganhou uma possível nova versão, ainda discutida, apresentada pelo antropólogo José Paulo Florenzano, professor da PUC-SP. Mas, no registro do único jornalista brasileiro que acompanhou a excursão, Gilberto Castor Marques, a informação – escrita no jornal “A Tribuna” – é de que foi decretado feriado local por conta da presença do clube sul-americano. Além do repórter, dois personagens daquela história – Lima e o próprio Edu, autor de um dos tentos – também são enfáticos: “O Santos parou uma guerra!”.